Meu segundo Candomblé

Era 1981, eu à beira dos meus 16 anos e vivendo o meu longo e fascinante abianato, estava prestes a ir ao meu segundo Candomblé, era o ajodun de uma conhecida da turma da escola, o Terreiro ficava em Edson Passos, Mesquita, que ainda era distrito de Nova Iguaçu. Não me lembro o nome da rua, e não tenho muitas referências visuais, já era bem tarde da noite e as ruas do bairro eram bem escuras. Era um grupo de 8 pessoas, Márcia, Ogan Miúdo, Cabelo (não sei seu nome), Beto, Dofono de Oxossi, Luango, Cacá de Oxaguiã e eu. Pegamos o ônibus 910 na Ilha do Governador até Madureira e depois o trem Japeri para Edson Passos, chegando lá um outro ônibus até próximo do Terreiro.

Finalmente chegamos, quando o ônibus se afastou deixou poeira e o som dos atabaques vindo de algumas quadras que ecoava naquela noite bem escura. Caminhamos mais ou menos uns 500 metros e chegamos ao local, um muro branco e alto, sobre ele um porrão de barro com um laço branco dividia a rua do sagrado, adentramos o Terreiro, eu era o último da fila indiana dos 8 e desviando das pessoas que estavam do lado de fora do barracão entramos em uma espécie de varanda coberta, meus amigos falaram com algumas pessoas da casa e entramos no barracão para assistir a cerimônia que já havia começado. Não consigo descrever a minha sensação, era um pouco de palpitação no coração, um pouco de medo, alegria de estar ali, mesmo após uma verdadeira viagem para chegar. Minha atenção era toda no Candomblé, meus amigos se acomodaram no barracão em seus lugares, Pai Miúdo juntamente com Cabelo foram tocar, Beto sentou-se próximo aos atabaques, Dofono ficou de pé ao lado de Beto, os demais ficaram circulando, eu, como abiã fiquei em um canto da assistência observando.

Chegou o grande momento, a Iya saiu de uma das portas do barracão conduzindo nossa amiga Jussara, o run dobrava enquanto uma cantiga da Roda de Xangô era entoada por todos, depois da Roda, os Orixás chegaram ao ritmo do alujá, alguns Orixás saíram do barracão e voltaram vestidos e paramentados para o Ijó Mimo Orixá (Run) e assim seguiu o Candomblé por mais alguns pares de horas.

O dia ainda não tinha a presença do sol e o Candomblé foi encerrado com inúmeras cantigas para Oxalá, serviram para todos um prato com comida, pelos anos que passaram não sei descrever o que tinha no prato. As pessoas começaram movimentar-se trocando de roupa e arrumando bolsas e malas. Nossa jornada de volta era longa, assim, fomos para o ponto de ônibus seguindo os passos de outras dezenas de pessoas que também estavam no Candomblé, naquela época quase ninguém do Santo tinha carro, não existia celular muito menos Huber, então o que nos restava era algumas horas entre ônibus e trem para retornarmos a Ilha do Governador. Quando entramos em casa o sol estava quente, e nossos olhos ardendo por estarem tanto tempo abertos.

Não me lembro o nome da Casa nem o nome da Mãe de Santo, e qual era o ajodun da nossa amiga Jussara, porém, ter ido neste Candomblé, assim como em quase todos que íamos na época, apesar de não ter sido fácil, foi muito prazeroso e me marcou, talvez um pouco por toda dificuldade, pela minha juventude, talvez pela simplicidade que era o Candomblé da época, tudo era mais difícil, e deixava o Orixá mais divinizado eu acho.

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